sábado, dezembro 31, 2011

Quase, no verão de Porto Alegre

Sim eu estava bêbado. qualquer um estaria bêbado em Porto Alegre numa sexta feira de verão as 2h da manhã...
do contrário não estaria acordado. Acordado e sóbrio? Só alguém tomando antibiótico, e quebrará as regras impostas pelo médico
as 3h, invejando a ébria e despreocupada alegria dos seus amigos, sei do que estou falando.
Mas tenho que descrevê-la. Poderia iniciar pela sua saia solta que deixava um vazio de um palmo e meio joelho acima,
um vazio que percorria com graça a sua pele glabra como um pneu slick. A sua saia estava na posição exata que faz a divisa entre o sensual e o vulgar
Quando uma saia está na posição sensual, você diz algo com sensibilidade, coberto de um respeito cheio de segundas intenções...
Na posição vulgar você diz algo em tom desrespeitoso sem o mínimo cuidado.
Mas quando a saia está nessa posição, nessa gloriosa fronteira, você não diz nada, não se diz nada diante do que é santo.
você fica perplexo perante aquela indefinição, não está preparado para aquilo, e numa próxima vez tampouco estará
as vezes o vento fazia força e a deixava na posição vulgar, mas tempo insuficiente para torná-la vulgar, infelizmente.
seu andar assemelhava-se ao de uma garça pisando com cuidado para não espantar os peixes ou afundar no mangue. E de fato estava certa na sua discrição, pois já chamava atenção o suficiente com seus saltos altos e finos como um hashi.
Os seus olhos formavam um contraste praia-oceano com seu rosto, e ela me olhou. Me olhou fazendo a sua franja repousar lentamente sobre os olhos que me olhavam num tom selvagemente desafiador, quase hostil, piscou-os e os redirecionou para o seu destino, que não era eu.  
algo dizia que eu devia agir, tomar uma atitude como os caras fazem. Mas por onde começar? Começar o que? Ela está indo embora seu otário!
Vai deixar a única mulher interessante remanescente do verão de Porto Alegre passar incólume? É claro que não!
Num impulso desengonçado pela embriagues saltei da cadeira do bar, ela passou rapidamente pela minha frente e cumprimentei um taxista desconhecido pra disfarçar a péssima investida. Meus amigos que já nem notavam a minha presença pois eu tinha saído da conversa há mais de meia hora, pararam de falar por um
instante e me olharam num meio sorriso, já acostumados aos meus absurdos. Retomaram a pauta.
Decidi que deveria seguir aquela mulher, mas como não parecer um psicopata ou algo do gênero? É difícil para uma mulher que está sendo
seguida, pensar nas boas insenções de um homem desconhecido andando em zigue-zague. desisti. E a noite seguiu o seu curso normal, talvez as coisas estejam melhor em Torres ou em Garopaba.

quarta-feira, outubro 05, 2011

O cão

Passo naquela rua todos os dias, e sempre eles estão lá
três cães que me fazem festa sempre que passo naquela rua
é uma rua vazia: terrenos baldios, mendigos ocupando
e uma bela e novíssima concessionária de um azul que da vontade de ter carro
passo ali pois é caminho do meu trabalho
um dia senti falta de um dos cães,
passaram 5 dias e um cheiro forte emanava dos fundos da concessionária
era o cão que estava cravado na grade
fiquei imaginando quem seria o homem capaz de fazer aquilo
especulação idiota, pois são tantos...
o fato é que ninguém da concessionária atinou tirar o animal dali
e eu fui avisar, falei com um rapaz todo engomado aspirante a yuppie
que me disse: pois é, ja me avisaram...
pensei: já avisaram...
me veio toda aquela coisa de ação direta, Anarquia, molotovs explodindo carros e yuppies também
mas eu precisava almoçar, fui escravo da sobre-coxa lassa que me aguardava em casa e abandonei Bakunin

e o cheiro está cada vez pior. Acompanho dia após dia o processo de putrefação do cão
cada dia menor e com formas mais...mais...cubistas. Seu focinho está apenas com os dentes de cima
e se vê um belo verme que lhe percorre o que resta das vísceras
Há uma grande festa acontecendo ali. É no corpo de um cão que a alteridade se torna concreta
irônico, cães sempre são melhores...talvez por isso que Diógenes de Sínope era chamado de "o cão" pois era o melhor.
perdi a esperança de alguém o tirar de lá...
eu o tiraria se fosse por ele.
o fato é que por causa desse cão penso na morte toda a manhã
mas isso não é mal. O pior é pensar na morte à noite, sempre foi.
O que mais pode sugerir a morte como pensamento do que ela mesma?
Tenho esperança agora de ver como acontece o processo de fossilização...
meu agnosticismo me permite não duvidar de nada...
E me permite ser um covarde excêntrico
E me permite ser evasivo quando perco a razão
Ó sim posso ser imparcial. Que piada.
Ser imparcial é tentar ficar em cima de um muro fictício.

quarta-feira, setembro 21, 2011

Esperança

É um decote mal calculado

Uma saia leve no vento

É insistir em apalpar o latão de Skol sempre quente no Bourbon Ipiranga

São as teorias da educação

É voltar sentado no ônibus depois do trabalho

A esperança estava aqui agora mesmo

Vi esperança nos teus olhos ontem e foi bom.

Esperança é acreditar no que não acontece, é como a fé. Fé e esperança, uma não existe sem a outra...
É por esse motivo que os ateus quando não são os piores são os melhores: ou são criaturas embalsamadas num véu de amargura; ou são os mais vivos, sempre a produzir alguma coisa...tem uma noção de que só morrerão quando forem esquecidos. Serão imortais enquanto os vivos os citarem lembrando de seus grandes feitos.

Esperança é um farelo de pão que cai da mão de um soldado brasileiro no Haiti

Não tem nada a ver com o "Criança Esperança"

Coitadas das crianças. Depositam-lhes todo o peso do mundo dizendo que elas que são a esperança 

Esperança tem a ver com espera, é uma banalização da espera...

segunda-feira, maio 23, 2011

"Pormenores"

Transito no vão estreito que existe entre o artista e o arteiro, lugar que costumo chamar "Estreito dos Mentirosos". Brinco nessa fissura que se abriu, e vou de um lado para o outro como um bêbado que tenta andar sobre a faixa.


Despenco no abismo que há entre o gênio e o idiota, "o Penhasco da Mediocridade". De lá, por vezes vejo o mundo do alto com a palma sobre a testa, por outras me esborracho no chão da vulgaridade, me choco contra a realidade que me choca. É sobre ela que falo, mas não me sinto sobre ela.

Não mais.

Um operário que deixa a fábrica para estudar e falar pelos operários deixa de ser um operário e já não pode falar por eles, mas quem nunca foi um operário nem deveria tocar no assunto.

Estou flutuando sobre o nada... Pairo rente ao chão, flutuo entre homens e mulheres, que não me percebem. Mas no fundo sabem que sempre estive ali, mesmo que não se pudessem levar a expressão ao pé da letra.

Estou inebriado pelas informações que emitem. Tento absorver apenas o necessário, depuro a palavra, destilo ao meu paladar. Gosto de coisas fortes e contundentes, não me apego aos pormenores, vou montando as estruturas num plano concreto,

No entanto os pormenores somos nós.

quinta-feira, maio 05, 2011

A CIDADE E O TEMPO

Na cidade não. Não é possível na cidade.
Não posso aceitar que alguém da cidade tenha a solução.
Alguém da cidade pensa como alguém da cidade, a cidade é o problema.
Na cidade sujeitos viram objetos e objetos viram sujeitos,
criam coisas magníficas mas em vez de usá-las em seu favor, viram escravos delas.
Não se produz para viver, mas se vive para produzir.
Está tudo ao contrário por la.
Quem está bem na cidade? São poucos, A maioria padece no vai-e-vem frenético, na hora absurda da cidade.
Me refiro a noção de tempo, fala-se muito em ganhá-lo ou perdê-lo na cidade.
Este produto: o tempo, é um artigo de luxo na cidade, está sempre em falta. Na lei da oferta e da procura sabemos: o que está escasso inflaciona.
Sabes aquela minoria que está bem na cidade?
Só está bem porque pode artificializar tudo aquilo que a natureza oferece gratuitamente no tempo certo.
Estes, além de tudo, tem costumes estranhos.
Por possuírem o tempo, diria, por ter o monopólio do tempo, ignoram-o completamente.
Querem sentir frio no verão e calor no inverno, querem parecer velhos quando novos e novos quando velhos, gastam inclusive grandes somas para conseguir isso.
O pior é que para conseguirem todo esse tempo, estes, usurpam todo o tempo da maioria. Empregam-nos, governam-os .
Os que empregam dizem que lhe dão o sustento, que o dinheiro vale mais do que tempo.
Os políticos dizem representar aqueles que não tem tempo.
Mas como alguém que tem tempo pode fazer bem àqueles que não tem tempo? Se roubam-lhes o que tem de mais precioso?
É absurdo como na cidade se fala muito em aproveitar o tempo livre. Mas o que fazem com o tempo além de estarem presos?
Pois suponho que o contrário de tempo-livre seria tempo-preso. As pessoas da cidade estão sempre com tempo-preso. Estão a erguer impérios alheios e a realizar os sonhos dos outros dentro de fábricas, lojas, estacionamentos, bordéis...
Tudo para fazer mais bem, aos que estão bem na cidade.
Gastam todo o seu tempo, encarceram-no, para da-lo àqueles que não sabem o que fazer com ele.
É por essas e por outras que te afirmo filho: não pode ser alguém da cidade.

segunda-feira, abril 25, 2011

Últimos Agradecimentos de um Contemporâneo

À Maconha: por me tirar a vontade
À Cocaína por me tirar a felicidade
À Ritalina por me tirar a criatividade

Ao Leopoldina: quebrada.
Pelo nariz quebrado e a facada.

À Bom Jesus: quebrada.
Podem ficar com minha alma, por vocês seqüestrada.

Às vitaminas, por não se meterem nisso.
À estricnina, por terminar o serviço.

quinta-feira, março 31, 2011

Noite de Março de 2011...

Ao voltar da aula , ontem à noite, fiz uma rápida manutenção de minhas redes sociais e fui deitar no sofá com a pretensão de dormir.
Durmo no sofá, pois não tenho mais a quem agradar com uma cama arrumada, agora sou apenas eu, com todos os desconfortos que um homem impõe a si mesmo quando mora sozinho...
sem uma mulher, que ao mesmo tempo que inferniza sua vida, deixa você um sujeito mais próximo daquilo que chamamos de civilizado.
Regras, planejamentos, nada disso. Agora você é puro pragma.
Nem tudo é ruim, visto que desperta a curiosidade de pessoas que ficam intrigadas questionando como alguém sem emprego fixo, sem disciplina e alcóolatra sobrevive.
As mulheres te acham misterioso.
Mas as pessoas misteriosas, ao passo que atraem mais parceiras, conseguem mantê-las por pouco tempo.
Nenhum misterioso é maior que o seu próprio mistério.
Aquele papo bacana, com o passar do tempo sempre acaba perdendo para o fato de você não ter dinheiro para levá-la ao restaurante, ao motel, etc., o encanto acaba com a mesma rapidez que encantou a menina.

Mas como eu vinha dizendo, estava no sofá.
Esse é o foco.
Eu estava num estado de semi-transe quando tudo começou, mas de modo algum dormindo, ou chapado.
Estava lúcido, embora não tivesse o controle de parte do meu corpo.
Não havia ninguém ali, mas eu estava beijando alguém, não sabia quem era, tentava identificar aquela mulher que me perturbara o sono, aliás torcendo para que fosse uma mulher.
Podia sentir o seus lábios entre os meus lábios, e era bom.
Mas a sensação de prazer ia sendo subtituída por um medo terrível na medida que eu tentava me mexer e o corpo não respondia. Ainda assim eu tentava explorar aquele momento, foi quando pude vê-la melhor e era apenas um vulto vermelho e preto.
Apavorado tentei expulsá-la, mas sua força era muito maior. eu estava no mundo dela e não o contrário.
Nesse interim, movi minha cabeça para trás e pude ver minha gata, ela estava vendo a agonia pela qual eu estava passando mas não se movia, estava estática e seu olhar fixo em algo que estava acima de mim não em mim...tive medo da minha gata.
Foi então que direcionei minha força para voltar para dentro de meu corpo, notei que não estava mais dentro dele, não por inteiro,
A mulher continuava ali. Parece que não se conformava com a minha rejeição, abraçava-me contra o seu corpo sombrio e me olhava com seu rosto sem olhos, consegui voltar para meu corpo e então tive a pior de todas as sensações: senti que estava sendo brutalmente puxado para fora do sofá, fortes fisgadas no tendão, os dedos dos pés encolhidos pareciam as garras de um urso.
Nos raros momentos em que conseguia algum movimento, este era apenas com o tronco. brusco, aos solavancos e completamente inútil.
Minha gata saiu correndo.
Bravamente me desvencilhei daquela mulher indesejável que sumiu em meio as trevas da sala, eu ,quem diria: acendi uma vela para Oxum, uma estátua, um símbolo, não consegui fugir do óbvio, do medo, do fantástico, do sobrenatural,

Espero não tornar a ver da mulher de rosto flamenguista.

quarta-feira, março 16, 2011

Relacionamento Moderno

Prefiro me relacionar com um livro de poesias.

Pois ao contrário dos longos romances e dos densos livros de história, que necessitam ser namorados. Com os livros de poesia podemos apenas “ficar” de vez em quando.

terça-feira, fevereiro 08, 2011

Mito do Bom Selvagem ou Antes de Sartre

Dedicada à amiga Sara Guerra, que não acredita nas essências mas entenderá a essência dessa humilde poesia.

Mito do Bom Selvagem ou Antes de Sartre (2007, após o Encontro Regional dos Estudantes de História em Lajeado)

Acho que estamos ligados um a um, sem a necessidade do ancestral comum.
Andávamos de mãos dadas há muitos anos atrás até que alguém deixou de fazer o bem e deu pra trás, sem a necessidade do Satanás.
Acho que perdemos nossa essência acreditando cegamente na ciência, que tantas vezes provou verdades através de mentiras por conveniência.
E o que há pouco tempo era uma verdade absoluta, hoje não passa de uma mentira fajuta.
Perdemos a nossa essência quando o primeiro desgraçado se achou mais branco ou mais preto, e se achou melhor por isso, e nisso, achou uma razão de viver e matar.
Algumas identidades tornaram-se mortais.
Hoje não sei se evoluímos ou simplesmente perdemos a nossa essência.
Não sei se construímos ou destruímos nossa residência.
Pois temos um planeta em comum, já disse, estamos ligados uma a um.
Mesmo contra a vontade de alguns, contra a infeliz vontade de muitos.
Perdemos a nossa essência transformando nosso paraíso em penitência.
Hoje nos debatemos por um quadrado de cimento e almejamos o enriquecimento, que não acontece sem no mínimo dez empobrecimentos.
Mas nada disso seria preciso se não tivéssemos perdido a nossa essência, se mesmo adultos continuássemos crianças na nossa descomplicada existência.
Se continuássemos desfrutando dos imensuráveis campos, sem cercá-los, sem depredá-los, é necessário saber fruir.
Hoje muitos debatem soluções possíveis para o fim da violência.
Debatem, debatem...
Altercam!!
Tanto! Que existe uma verdadeira guerra para saber quem vai nos mostrar o caminho da paz.
Perdemos a nossa essência, quando tornamos impossível a nossa convivência,
Quando fizemos da nossa diferença algo detestável e do ódio o único fator estável,
Fizemos da alteridade a saudade da identidade. Sim, tentamos transformar a alteridade em nós mesmos, para isso foi preciso destruir o diferente, humilha-lo, escraviza-lo, encarcera-lo.
Destruímos o nosso mundo na velocidade do eclipse,
Sem a necessidade do apocalipse.
Nossas traições e beijos malditos levaram muitos à morte,
Sem a necessidade de Judas Escariotes.
O que faremos? Já que não fizemos!
O que seremos? Visto que não fomos?
O que sentiremos em nosso leito de morte?
Se bem antes da carne o nosso espírito já está putrefato!
Se o preconceito é o nojo do contato!
E sem contato nada vale a pena...
Que saudade da infância...
Que naquela época ninguém morria.
Que eu mesmo me pensava imortal.
Que tinha vó, tinha bisavó, a família era grande naquela época.
Que nada tinha maldade naquela época,
Que foi naquela época: a melhor época.
Que o jogo era amigável,
Que a disputa era saudável,
Que o jogo da velha ainda era novo.
Que eu não via no churrasco um boi morto.
O mais triste é saber que nada era somente belo, agradável e justo,
E que a inocência da infância me cegara para não enxergar a podridão das coisas.
A gente se corrompe em uma curta vida tal qual o mundo em milhões de anos.
Eu também perdi a minha essência quando perdi minha espontaneidade,
E agora penso mil vezes antes de falar e não falo.
Nesse exato momento, falo porque escrevi.
Agora meu pensamento apóia-se no sentimento de não enquadramento nos ambientes que já nem mais freqüento.
Sinto-me absolutamente só, mesmo assim costumo conversar sozinho mais do que com os outros,
E o que mais me incomoda nesse momento é a minha própria presença, gostaria por um momento conseguir parar de pensar.
Preciso acreditar em algo, ao menos voltar a acreditar em mim.
Porém, não quero platéias vaidosas cheias de embasamento teórico e vazias de criatividade, cheias de citações alheias e usando cérebros alheios e inclusive imitando os gestos alheios.
Tampouco populares focando-se em meus defeitos.
Se for assim prefiro versar aos cômoros de areia, que são perfeitos e nem por isso me julgam. Que continuam os mesmos em sua essência, apesar da volatilidade das suas formas.
Porém prefiro a crítica ao falso elogio, de alguém que enquanto eu falava me enxovalhava em seus cochichos,
Na maldita hora em que abri a minha boca,
Na maldita hora que usei a parte mais polêmica do meu corpo.
Ela que é a causadora de todos os antagonismos.
Ela que dá aos pobres, o convite para a miséria.
Ela que explicita o amor e o ódio,
Que ajuda a tragar o veneno da fumaça,
Ela que é indispensável para a trapaça.
Que beija bocas vivas e testas mortas.
Que serve para chegadas e adeuses.
Ela, que mesmo bela e macia, esconde os dentes da antropofagia.
Que oculta os dentes da raiva e retém a saliva.
Que ajuda a fingir que gosta.
Ela que não me deixa fugir ao tema.
Por causa dela que perdi minha essência.
Por usá-la de mais e de menos...

Kauê Catalfamo - 2007

segunda-feira, janeiro 10, 2011

A Casa no Mato

Que saudade da casa no mato.
De escutar o cantar dos pássaros na manhã agradável do mato.
Lembro que em meio à sinfonia, ficava tentando detectar cada ave que ali cantava.
Saudade de ouvir minha mãe falando sem parar com sua energia incontrolável na casa no mato.
Saudade dos inúmeros cães e gatos que convivem tranquilamente na casa do mato.
Saudades de ler a noite ouvindo o cantar dos sapos na casa no mato.
Das flores, das frutas, dos peixes, do fogão a lenha e a churrasqueira de tijolos improvisada cheia de amigos em volta.
Saudades do vento fresco, da terra nova, da areia, das fotos na parede, da bagunça, da arquitetura assimétrica, dos livros antigos, dos móveis, dos brinquedos velhos da minha infância, saudade da minha família unida, do meu irmão dormindo.
Saudade do barulho dos passos no chão de madeira, da rede, das muitas janelas e portas, da minha irmã me enchendo de perguntas.
Que saudade enfim, de tudo que compunha a casa no mato.